O mundo Cyberpunk: o destino de nossa geração

Prefácio

Dia após dia, verificamos que o mundo parece caminhar a passos largos para um abismo sem volta: a sociedade cada vez mais doente mentalmente, o acelerado empobrecimento de países, a tecnologia cada vez mais aprisionadora e anúncios para todos os lados. Isso não é algo que aconteceu por acaso, é um processo que a mídia de entretenimento dos anos 1970 e 1980 já vinham alertando por muito tempo e, atualmente, videojogos como o Cyberpunk 2077 mostram a sociedade para a qual estamos nos dirigindo.

Sendo assim, em trocas de conversas e cartas eletrônicas (e-mail) com um amigo chegamos a essa conclusão que no parágrafo acima foi apresentada. O texto abaixo será uma redação escrita por meu amigo, João Pedro, que resume perfeitamente a situação na qual estamos neste momento, fazendo todo um apanhado geral, e concluindo como será o futuro daqui para frente e o quão corretos estavam as diversas interpretações feitas por diversos filmes e videojogos.

Controle da Internet, liberdade de expressão

Ultimamente, temos percebido o tamanho autoritarismo de diversos países ao redor do mundo para com perfis na internet e manifestações de cunho político contra o que aí está. O videojogo Cyberpunk 2077 trouxe uma alegoria bem interessante: a Netwatch. Desde as revelações de Edward Snowden, a situação apenas piorou, levando à situação na qual estamos vivendo: o surveillance corporatism (incorretamente chamado de surveillance capitalism). Atualmente, não são apenas as ligações que são monitoradas, toda a atividade nas redes sociais está sendo vigiada, sendo que além de IAs, o pessoal tem literalmente agentes que criam contas falsas para ficar olhando a net em busca de conteúdo suspeito.

Corporativismo

Toda essa vigilância acima descrita também não é por acaso, ou seja, o atual estado de vigilância nas redes, nas quais as pessoas se tornam o produto das mega corporações é sintoma do atual arranjo político-econômico, o qual chamaremos nesse artigo de “Corporativismo”. Mao Zedong, o líder comunista chinês, chamava o Corporativismo de “Capitalismo Burocrático” para diferenciar do Laissez-faire (o capitalismo de livre mercado). A Escola Austríaca de Economia alertava desde o século passado sobre as empresas se tornando amigas do Estado em troca de terem muito mais poder e ditar todas as regras, matando os pequenos concorrente, criando um enorme cartel. Basicamente, a intervenção estatal tornou empreender tão complicado ao ponto que os pequenos empresários mais trabalham para manter a empresa de pé do que qualquer outra coisa, sendo que a maioria não tira renda da própria empresa por anos, enquanto que apenas as grandes MegaCorps têm alguma chance de participar da economia de escala, e portanto se sobressair. O capitalismo é vivo e ele se adapta às circunstâncias. Como o intervencionismo criou custos demais, ele deu um jeito de sobreviver apesar disso, mesmo que o resultado seja horrível.

Então, o que muitos socialistas falam, de que o capitalismo seria projetado para manter os pobres no mesmo estado para sempre, é uma grande falácia. Caso realmente vivêssemos em uma economia de mercado Laissez-faire, megacorporações não existiriam, visto que não teriam nenhuma espécie de ajuda do Estado para manterem-se de pé com todo o poder e tamanho que atualmente possuem. Forçando-as a competirem com todos os outros empreendedores independente de tamanho, graças a ausência do Poder de Mercado.

Advertising (Anúncios) para todo o lado

Outro elemento essencial do gênero e estética Cyberpunk é a ideia de uma realidade repleta de anúncios e propagandas por toda parte. Pensem nas ruas do Distrito de Akihabara em Tokyo ou na Times Square em Nova York, porém muito mais poluídas com anúncios. Anúncios no trem, em casa, propagandas que percorrem a lateral inteira de arranha-céus e no seu ápice, como visto em Night City do videojogo Cyberpunk 2077, propagandas que são projetadas via holograma nos céus, sendo que mesmo nas zonas rurais é possível ver os anúncios da cidade de longe. Essa é a realidade Cyberpunk, uma realidade onde os anúncios são inescapáveis. Cyberpunk é um mundo de anúncios.

Blade Runner, lá em 1982, trouxe um mundo muito parecido com o que vivemos hoje. O longa metragem tem a sua história no ano de 2019 e desde que foi aos cinemas, trouxe uma crítica disso. Podemos ver que 40 anos depois a situação foi degringolando da mesma forma. No filme, além do perceptível exagero de anúncios por toda parte, o que ficou marcado como parte da estética dos universos cyberpunks, tinha um elemento no filme que era parte do problema que vemos hoje. A cada tanto tempo no filme aparecia um dirigível no fundo com vários outdoors e um alto falante. O que esse dirigível estava vendendo? Explico:

No mundo de Blade Runner, a megalópole de Los Angeles é uma das poucas civilizações em 2019 depois que uma guerra nuclear devastou o mundo, acabando com praticamente toda a natureza e deixando quase nada de lugares civilizados. E o dirigível que aparece várias vezes iluminando o Deckard enquanto ele vai atrás dos Replicantes está sempre anunciando “venha para as off-world colonies, onde você terá muita prosperidade e a oportunidade de começar uma nova vida sem os problemas da superpopulação”. Esse ad é uma opressão por si só porque ele ficava tocando 24h/7 sobre a cabeça das pessoas e lembrando delas de como a vida é uma merda na Terra, porém poderia ser maravilhosa nas colônias, como na Lua.

A questão é que, através de outras obras do autor de Blade Runner e derivados, a gente descobre que tudo não passa de uma farsa. Apenas quem tem dinheiro consegue ir para as colônias fora da Terra, mas a realidade é que, chegando lá, o ambiente é inóspito e boa parte das civilizações espaciais estão em guerra uma com as outras por causa de interesses corporativos, já que quem manda nas colônias espaciais nada mais é do que as corporações que fazem mineração no espaço, e assim como na Terra, elas querem se destruir. Ou seja, para quem fica na Terra, esse Ad é uma tortura porque os faz pensar que a vida deles poderia ser melhor lá fora, mas para quem consegue ir para fora… desejaria ter ficado na Terra. É tudo mentira! Somente esse elemento narrativo do filme/livro já resume todo o problema do marketing atual, a constante opressão (porque tu vê anúncios forçadamente hoje em dia, não tem pra onde correr, eles estão lá) das pessoas com a afirmação de que existe uma vida melhor e que você não está nela, mas basta fazer o que está no Ad que você chega lá. E a gente sabe, o cérebro se condiciona, de tanto escutar isso até as melhores pessoas as vezes começam a duvidar se não estão Missing Out. Afinal, de tanto escutar a gente começa a acreditar.

Técnica de Tecnologia Invasiva

Os anúncios inescapáveis que o Cyberpunk traz pode apenas ocorrer graças a tecnologia. Atualmente, é ela quem controla o ser humano, sendo que seu motivo de invenção foi para nos servir. Tudo é tecnologia hoje em dia, como os filmes que estão atrás de paywall, notícias, conhecimento, a Steam, software obrigatório para usar o seu computador, carro que requer assinatura para desbloquear todos os usos do sistema elétrico, em alguns casos já está no ponto de ser obrigatório software até mesmo em nossas geladeiras. Claro que existem métodos para como o Torrent e outras formas de não depender da modernidade, mas com o tempo tá tudo ficando escasso, o número de PCs antigos é limitado, os sites de pirataria estão caindo com o tempo, vários filmes estão se perdendo porque quase não tinha seed e alguns pararam de “seedar” total. Muitas pessoas mais novas nem sabem o que é piratear inclusive, pois é mais cômodo viver de streaming. Nesse sentido não vejo o futuro sendo tão brilhante, no máximo sobrevivendo através de alguns entusiastas dessas tecnologias.

O pico da Tecnologia Invasiva, o passo mais largo para o nível Cyberpunk é a integração homem-máquina, justamente o que o bilionário Elon Musk está fazendo com os testes de implantação de chips. No momento da publicação desta redação, esses experimentos não estão funcionando, porém esses bilionários que investem neste tipo de tecnologia não descansarão até conquistarem esse feito e o capital necessário não está em falta para eles investirem nisso. Caso cheguemos neste ponto, perceba que que veremos igual ocorre no Cyberpunk: anúncios de como um chip é imprescindível e, além disso, podem-se listar diversos motivos para implantar um chip. O grande perigo, além de falhas mecânicas poderem lhe custar a sua vida, provavelmente, ficaríamos inteiramente dependentes em um software proprietário, isto é, cujo controle está na mão de um terceiro, remotamente. O ponto mais assustador sobre isso é o de que as pessoas instalarão um chip desses, porque, além da pressão do marketing, as pessoas que colocarem pressionarão as que não tem, da mesma forma que quando começou a se usar facebook no passado, usando o argumento de que “não ter uma conta na rede social da Metta é estar fora da sociedade”.

Conclusão

Tendo em vista todos os elementos apresentados anteriormente, podemos afirmar que sim, o mundo caminha a passos largos para o estado cyberpunk. Felizmente, muitos dos medos descritos pelos autores da década de 80, não parecem que se tornarão realidade como a guerra nuclear, a falta de alimentos, fome e a devastação total da natureza, pelo contrário, a natureza continuará firme e forte, dada a sua capacidade de adaptação, mesmo após a extinção do ser humano. Além do fato de que, ano após ano, a produtividade agropecuária apresenta aumentos extraordinários. Sendo assim, é remota a possibilidade de chegar ao ponto que eles imaginavam. E muito mais remota de chegar ao ponto de outras distopias como Mad Max e Water World.

Por outro lado, nos parece que a situação dos softwares proprietários e tecnologia invasiva só tenderão a piorar daqui para frente, só que, em contrapartida, percebemos um movimento na sociedade que pode pelo menos frear essa realidade: diversas pessoas gostam de coisas antigas (mesmo jovens). É perceptível que a opinião e gosto público está se alterando para coisas do passado, como carros antigos e o estilo de vida antigo. Além de que o tema de detox de redes sociais e o reaprendizado de como socializar estão ficando cada vez mais em alta. Então, pode-se afirmar que, em longo prazo, surgirá um grupo de pessoas que optarão por não aceitar as mudanças deletérias que o Cyberpunk tenta impor e será contrário a tudo isso. Além disso, o capitalismo tenderá a se adaptar a esses consumidores, evitando-se o mundo imaginado por Mike Pondsmith. Do contrário, provavelmente o mundo, em 2019, já estaria igual ao de Blade Runner. Contudo, mesmo que não cheguemos ao ponto descrito nessa ficções, a tendência é de que a realidade cada vez mais se aproxime, e se torne similar ao que nelas é descrito.